06 Outubro 2009 - 09:06

Dom Pedro II ainda vive no imaginário popular de Piranhas

Agência Alagoas
Histórico Museu de Piranhas

Estamos no dia 18 de outubro de 1859, às 11h45. Nessa data, Dom Pedro II desembarcava em Piranhas. O dia estava quente. Sobre a gente, ele observou: “Um dos piranhenses disse ‘que solão’! Gostam muito de tais aumentativos”. Naquela época, a vila contava com trezentas a quatrocentas casas.

“Tirei uma vista à pressa do rio junto a Piranhas de Cima, através da grade de pau da janela do meu quarto, e depois dormi até o jantar”, escreveu. O sobrado, que pertencia ao subdelegado de polícia, Joaquim da Costa Campos, passa atualmente por reformas. Deve ser reinaugurado nos próximos dias.

Foi em Piranhas que o navio Pirajá ficou atracado. Da vila, o imperador e toda a comitiva, acompanhados da Guarda Nacional, seguiram para as cachoeiras de Delmiro Gouveia a cavalo. Na volta, pernoitou no distrito de Entremontes, que pertence ao município.

Deixou registros sobre o lugar. “Chegamos ao Armazém ou Entremontes às 3h30; jantamos aí na casa de um Anacleto Brandão, cuja família é quase tudo nesta povoação, sendo um dos filhos o capelão, outro o médico, e outro oficial da Guarda Nacional”, apontou.

Há 150 anos, o lugarejo era ponto de parada de muitas embarcações. As mercadorias eram deixadas no local. Por isso, passou a ser conhecido como Armazém. A passagem do imperador marcou tanto a comunidade que muitos moradores, ainda hoje, atribuem a ele a escolha do nome Entremontes.

Contam também que esse teria sido escolhido pela filha de Dom Pedro. É história antiga, transmitida há gerações. “O povo dizia que a princesa Isabel, quando chegou aqui, perguntou o nome do lugar. Disseram que era Armazém. Ela não gostou e afirmou: ‘Aqui é Entre os Montes’”, revelou Erasmo Nunes Lisboa, 72, nascido no distrito.

Essa conversa foi confirmada pelo também filho de Entremontes José de Castro Sobrinho, 85. Mas é um engano. Durante a viagem do monarca, Isabel tinha apenas 13 anos. Ficou no Rio de Janeiro. “A imperatriz Teresa Cristina também não esteve na região. Ela esperou o marido na Bahia. Essas informações que colhemos em Piranhas fazem parte do imaginário popular. Revelam a importância da passagem de Dom Pedro para a comunidade, que pode ser atestada até hoje”, explicou a museóloga Cármen Lúcia Dantas.

Somente no mês de dezembro, por conta da inauguração da Catedral de Maceió, Teresa Cristina viria a Alagoas, acompanhando o esposo. No entanto, para a gente de Entremontes, esses dados são apenas detalhes. Encontramos uma casa de bordados Princesa Isabel e a rua principal é a Dom Pedro. A família imperial ainda “vive” naquelas bandas.

E não é que o sobrado de Anacleto Brandão, onde dormiu o monarca, ainda está de pé? É de propriedade de Erasmo Nunes Lisboa, o mesmo que ouviu dizer que foi a princesa Isabel que deu o nome de Entremontes ao povoado. Além de morada, o casarão funciona como mercearia, a Santa Ana. Tem um daqueles balcões compridos de madeira e as mesinhas e cadeiras de metal, vermelhas. Parece quadro antigo, com gosto de cajuína.

Do Centro de Piranhas a Entremontes são 22 km de chão batido. Esse trajeto foi feito na companhia de um moço do lugar, Francisco Rodrigues Correia. Pense num homem conversador. Fala feito máquina e tem memória de computador. Sabe tudo sobre Virgulino Lampião (1898-1938) e seu bando.

Os tios-avôs de Francisco viviam em Piranhas. Foram torturados pela volante. Depois de uma compra de muitos mantimentos para o cangaceiro, foram pegos, e tiveram que revelar o paradeiro do grupo todo. Dias depois, Lampião estava morto. A história foi contada pelo nosso guia.

A história do cangaço margeia tanto os pensamentos de Francisco, que ele chegou a batizar suas duas embarcações de Lampião e Volante. Ele faz o passeio pelos cânions do São Francisco.

Fomos com ele também à Igreja Nossa Senhora da Conceição. O templo foi citado pelo imperador. “Fomos ver a capela construída por um homem como cumprimento de voto pelo seu restabelecimento de cólera-morbo”, relatou. O lugar é grande.

Do alto da torre, tivemos uma vista privilegiada. “Ninguém sobe aí. A escada é muito em pé e antiga. O povo não arrisca”, contou Francisco. Mas a curiosidade, típica dos forasteiros, levou-nos até em cima. O rapaz veio atrás. “E não é que é bonito mesmo...”, falou admirado. Os morcegos não se importaram com a nossa presença. Permaneceram quietinhos.

Embaixo, em frente ao altar, fica a sepultura de Anacleto Brandão, o anfitrião de Dom Pedro. O homem era mesmo importante. A família inteira está enterrada na igreja. Naquela época, acreditavam que assim estariam mais perto de Deus.

De volta a Piranhas

A conversa estava boa, mas precisávamos voltar a Piranhas, que também é conhecida como Cidade Lapinha. É uma das mais bonitas do alto Sertão. As casas antigas estão bem conservadas. Nos pontos mais altos, na igreja ou no restaurante, a paisagem é incrível.

É o rio. Mas nessa parte, o Velho Chico parece ainda mais bonito. As águas escuras de Penedo ganham o tom de verde-esmeralda. As pedras fazem recorte nas águas. Algumas canoas teimam em ficar por entre elas. Do mirante, temos a impressão de piscinas naturais e barquinhos — verdadeira aquarela.

Até do cemitério, carregamos boas imagens. Os mortos de Piranhas acordam e dormem com vista panorâmica. Sorte de poucos vivos. De lá, fomos direto para a igrejinha de Santo Antônio de Lisboa. É miúda e linda. Foi fundada por uma mulher, Matildes Tavares. O ano é desconhecido.

Sabe qual o nome da sede da prefeitura de Piranhas? Palácio D. Pedro II. O homem ainda é soberano por essas bandas. Vale a pena ir também ao centro de artesanato, com bordados e muitos acessórios feitos com o couro da tilápia.

Cenário de muitas histórias

No Museu do Sertão, a passagem é obrigatória. Lá, há muito da história do município e informações que todo bom nordestino deveria saber de cor. Nesse centro funcionava a antiga Estação Ferroviária. O prédio é belíssimo.

Nos painéis, é revelado que a visita de Dom Pedro, há 150 anos, propiciou o implemento da navegação a vapor e da estrada de ferro. Em 1867 teve início a navegação a vapor entre Penedo e Piranhas e, em 1878, começaram as obras da estrada de ferro Paulo Afonso.

No museu, fomos recebidos por Jairo Luiz Oliveira. Ele nasceu em Propriá (SE), mas adotou Piranhas como cidade para viver. Formado em turismo, foi uma das cabeças responsáveis pela criação da Rota do Imperador, projeto aceito pelo APL Caminhos do São Francisco. A expedição vai acontecer de 16 a 19 de outubro.

por Agência Alagoas

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  • Sabino Fidélis Parabéns pela iniciativa, fico muito feliz em saber que um alagoano preserva a nosso história, rica por sinal.PARABÉNS