Martha Martyres

Martha Martyres

Radialista, diretora da rádio Penedo FM, âncora do jornalismo no Programa Lance Livre

Postado em 25/03/2013 15:26

Cem Anos de História - A Batuta Transgressora

Estudava no Colégio Imaculada Conceição no final dos anos 70, em plena Ditadura Militar e todas as sextas-feiras participávamos do hasteamento da bandeira cantando o Hino Nacional reproduzido pela antiga vitrola que ficava na secretaria e tinha um alto-falante tipo “cornetão”, que emitia aquele som estridente e desprovido de graves e agudos.

Estavam todos os alunos perfilados e eu no final de uma das filas. Sempre gostei de música. Sempre, desde pequeno, fui (como ainda sou) fã de grandes orquestras como as de Paul Mauriat, Clebanoff, James Last. Num surto de incorporação do espírito de algum maestro, passei a reger, com uma batuta imaginária, a orquestra que executava o nosso belíssimo Hino Nacional.

Por estar no final da fila, pouco fui percebido por meus colegas. Mas eis que estava perto de mim sem que eu a notasse, a eficiente professora de matemática, América Dias.

Naqueles austeros tempos, foi quase um atentado anti-patriota o que inocentemente fiz. Ela, sem hesitar, me levou à diretora, Irmã Conceição, para as reprimendas necessárias. Por sorte minha, a diretora estava de ótimo humor e relevou o acontecimento.

Mas, confesso que um diabinho dentro de mim provocou-me a desafiar minha professora de Matemática.

América morava atrás da minha casa, na tradicional Rua do Amparo. Gravei um cassete de 60 minutos, dos dois lados, com o Hino Nacional. Coloquei duas caixas de som numa grade de um antigo galinheiro que mamãe tinha em casa, viradas bem para a casa dela e fiquei de tocaia esperando sua chegada.

Quando seu fusquinha dobrou a esquina do Tênis, acionei o tape-deck auto-reverse com o amplificador no volume mais alto. Ela entrou noite adentro escutando o Hino Nacional.

Na segunda-feira foi a vez dela. Sua aula foi usada exclusivamente para exprimir sua revolta: "Isto foi uma afronta a minha pessoa!, dizia ela encarando-me nos olhos. Fui, ao final, expulso da sala.

Sozinho, no pátio do colégio, confesso que me arrependi e temi pelas futuras notas baixas que certamente tiraria em Matemática.

Em seguida aparece Tico, que saiu da sala e veio me consolar. No recreio, mais tarde, muitos colegas vieram agradecer pela aula que não houve. O comentário no intervalo não poderia ser outro.

Graças a Deus aquela aula foi suficiente para o desabafo de América.

Já relembrei com ela o acontecido, muito depois de deixar de ser seu aluno, em alegre momento de nostalgia. Todos que conviveram com América sabem o quanto competente e preparada ela é. Aliás, a facilidade com os números é genética em sua família. Todos sabem o quão boa pessoa ela também é.

Minhas notas baixas em sua matéria, admito, foram culpa exclusivamente minha.
 

                                                                                                             Autor: Roberto José Peixoto

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